Fluxo continuo suspenso

2020-09-28

Próximos dossiês com chamadas de trabalhos abertas:

 Número 45:

ARTES TÊXTEIS: TRAMAS DE HISTÓRIAS, VIDAS E MEMÓRIAS

Organizador/a:

Dr. Ronaldo de Oliveira Corrêa (Universidade Federal do Paraná)
Dra. Marilda Lopes Pinheiro Queluz (Universidade Tecnológica Federal do Paraná)

Prazo para envio dos trabalhos: 31 de março de 2025
Previsão de publicação: dezembro de 2025

O dossiê tem por objetivo reunir textos que problematizem as artes têxteis, suas práticas, autoras(es) e redes de agentes, circuitos de circulação e artefatos, sentidos e significados. Entendemos que essa trama complexa, que contesta hierarquias estéticas e sociais (Simioni, 2020), delineia o universo da produção expressiva que envolve fios, tecidos, máquinas, conhecimentos, pessoas, instituições, significados e histórias.

Ao modo de Barthes (2002) e sua mitologia, percebemos as artes têxteis como narrativas visuais e táteis, ou seja, expressivas, que nos contam sobre como organizamos os sentidos do mundo e da vida social. Dito de outra maneira, como uma das formas de dar legibilidade sensível para os eventos, sociabilidades e ações que constituem pessoas, grupos e, em alguma dimensão, imaginações, imaginários e culturas.

A narrativa mítica, por meio de sua interpretação plástica, literária, visual e cinematográfica, informa as versões possíveis que nos permitem fugir de uma história única da e sobre as experiências sensíveis e humanas. Nesse movimento, concordamos com Adichie (2009) sobre a necessidade de produzirmos, conhecermos e fazermos circular múltiplas versões dos acontecimentos que marcam as experiências humanas, como uma tática para resistir a processos de homogeneização e estereotipação, comuns às culturas de consumo. Abrimos espaço, desse modo, ao dissenso necessário para a manutenção das disputas que produzem as estéticas e as éticas, marcadas pela raça e o gênero, a classe e a geração, no tempo presente.

Atentar às artes têxteis, em alguma medida, significa centrar a atenção em sujeitos sociais historicamente deixados à margem, ou denominados anônimos, nas narrativas sobre a arte, design, arquitetura e moda, mais especificamente, e da história social das sociedades ocidentais, de forma geral. Com isso, pretendemos problematizar as ausências de reflexão sobre as memórias individuais e coletivas, os saberes, as técnicas e tecnologias, as estéticas e éticas, que esses sujeitos sociais e suas práticas produzem ou inscrevem no cotidiano a partir dos gestos de bordar, tramar, tecer, amarrar, suturar, rasgar, vestir e mesmo, despir.

Por outro lado, as artes têxteis nos interpelam com suas materialidades, memórias, histórias e versões produzidas desde fora de um circuito institucionalizado da cultura, ou seja, descentradas, sobre as formas que a arte, o design, a arquitetura e a moda, materializam artefatos, espaços, narrativas e imagens como repositórios de subjetividades, memórias e experiências com e a partir dos corpos (Reiman, 2020). Essas versões, formulam argumentos, inscrevem estilos narrativos, configuram associações entre materiais e experiências que reivindicam a participação na arena artística, ampliando debates centrais para o tempo contemporâneo, a saber, as relações entre arte e política, arte e ativismo, arte e corpo, arte e cidade, arte e vida.

Nessa perspectiva, é possível, também, pensar nos processos históricos, nos diálogos que as artes têxteis de hoje estabelecem ao reatar nós com a produção realizada no período entre os anos 1970 e 1990, por exemplo. Algumas das questões propostas naquele momento se atualizam, se reinventam, permanecem, em um desejo de insistência, de lembrança ou de não esquecimento. Temas como os corpos, as violências, o habitar, a diferença, a natureza, entre outros, acumulam-se ao revisitarmos a produção expressiva da segunda metade do século XX em relação àquela que se apresenta nesse tempo que vivemos.

Por fim, a partir de um emaranhado de possibilidades, pouca legibilidade e muitos fragmentos, propomos reunir textos sobre as artes têxteis que, enquanto um arquipélago flutuante, provoquem a cartografia de circuitos e circulações de coisas, pessoas, significados, conhecimentos. Esse dossiê apresenta-se como um esforço de aproximação com reflexões que as práticas têxteis incorporam e convertem em coisas visíveis, táteis, sensíveis.

Referências

ADICHIE, Chimamandra Ngozi. O perigo da história única. TEDGlobal 2009, July 2009. Disponível em: https://www.ted.com/talks/chimamanda_ngozi_adichie_the_ danger_ of_a_ single_ storytranscript?language=pt

BARTHES, Roland. Mitologias. 7a. Ed. São Paulo: Bertrand Brasil, 2002.

REIMAN, Karen Cordero. Intervenções suaves: cumplicidades entre arte e mídia têxtil. IN: SESC Pinheiros. Transgressões do Bordado na Arte. São Paulo, 2020. Catálogo de Exposição.

SIMIONI, Ana Paula Cavalcanti. Transgressões do Bordado na Arte. IN: SESC Pinheiros.

Transgressões do Bordado na Arte. São Paulo, 2020. Catálogo de Exposição.

 Número 44:

O outro lado da Moda: Emoção, Memória, Sentimento

Organizadoras:

Dra. Rafaela Norogrando (CIAUD, ID+, LabCom, Universidade da Beira Interior – Portugal)

Dra. Ana Mónica Pereira Reis de Matos Romãozinho (LabCom, Universidade da Beira Interior – Portugal)

Prazo de envio dos artigos: 30 de novembro de 2024

Previsão de publicação: agosto/2025

Ao contrário de outras áreas do Design, a Moda desprende-se definitivamente do rótulo tantas vezes impositivo da funcionalidade e do mero utilitarismo, herança da modernidade. Talvez pela relação mais próxima e íntima que se estabelece entre corpo e objeto, aceitamos de modo mais incondicional as emoções e sensações que a moda nos proporciona.

É o que De Carli (2002) reforçou sobre a dinâmica da experiência da vivência do aqui e agora e o jogo dos sentidos nesse “sensacional da moda”. Ou como coletado por Merlo (2015), os discursos que são construídos e perpetuados dessa memória. Por outro lado, a Moda enfrenta grandes desafios em função do estado do mundo, das alterações climáticas, do individualismo e liberdade paradoxais que caracterizam a chamada “hipermodernidade” analisada por Lipovetsky (2020).

Como constata Silvano (2021) a volatilidade das imagens que caracterizou as últimas décadas trouxe consigo uma distanciação face aos objetos que explica em parte a pobreza da relação que estabelecemos com eles e a consequente facilidade do seu descarte.

A procura de resposta a este estado das coisas refletiu-se em fenômenos como o slow fashion pela revisão do consumo e a consciência sobre a cadeia produtiva. Segue-se uma valorização da aquisição de roupa de segunda mão, aplicativos de serviços de personal styling ou da revalorização da manutenção das peças, muitas vezes herdadas da mãe ou da avó.

Somos progressivamente estimulados a olhar para a Moda com maior profundidade, pelo modo como desperta emoções e memórias, pelo facto de dizer sempre algo sobre nós e, sobre o modo como nos posicionamos no mundo ou como ação de empoderamento no mesmo, uma afirmação da nossa visão cultural, de ativismo e crítica a um contexto socioeconômico dominante.

O Design de Moda sempre se beneficiou das rupturas e experimentações operadas no campo das Artes Plásticas, enquanto possível veículo de linguagens inovadoras e denunciadoras de uma atitude inconformista que se pode traduzir em produtos portadores de significados e emoções, logo possivelmente menos voláteis e descartáveis (Romãozinho, 2024).

A Moda é um poderoso instrumento de comunicação, por vezes irreverente e transgressora. Duarte (2017) refletiria na sua obra sobre a força das imagens na Moda, vínculos para quem prefere expressar-se com o corpo todo e não só com a voz, articulando discursos sem palavras, ocupando sempre um espaço livre entre a ficção e a realidade.

Ou ainda, como Benetti e Norogrando (2016) apontam que as emoções e sentimentos vinculados às áreas performáticas da Moda e da Música estariam relacionados a um sonho ou delírio em uma busca pelo intangível em uma fantasia aos desejos pessoais. Que segundo Anjos (2020) se não criamos estas imagens acabamos por consumi-las. E assim, esta relação pessoal daquilo que emociona também é trazido por Carvalhal (2020) na construção de imagem de marca em uma “simples” conexão de uma indústria com pessoas.

Convidamos os autores a partilhar os resultados das suas investigações científicas de natureza mais teórica, experimental ou aplicada, que se intersectam com o presente tópico e que podem corresponder a perspectivas multidisciplinares e reflexivas por diferentes áreas.

Bibliografia de Referência

ANJOS, Nathalia. O Cérebro e a Moda. São Paulo: SENAC, 2020.

BAUDRILLARD, Jean. O Sistema dos objetos. São Paulo: Editora Perspectiva, 2004.

BENETTI, Alfonso; NOROGRANDO, Rafaela. Linguagens, emoções e memórias: relações entre música e moda. In: NOROGRANDO, Rafaela; BENETTI, Alfonso. Moda, Música e Sentimento. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2016.

CARVALHAL, André. A moda imita a vida: Como construir uma marca de moda. Paralela, 2020.

CHAPMAN, Jonathan. Meaningful stuff: Design that lasts. Cambridge: The MIT Press, 2021.

DAMÁSIO, António. A Estranha Ordem das Coisas: A vida, os sentimentos e as culturas humanas. 12 nd ed. Lisboa: Temas e Debates, 2017.

DE CARLI, Ana Mery Sehbe. O sensacional da moda. Caxias do Sul: EDUCS, 2002.

DUARTE, Cristina. Moda e Feminismos em Portugal: O género como espartilho. Lisboa: Temas & Debates – Círculo de Leitores, 2017.

FETTOLINI, Jose. Principios y procesos éticos en el diseño y la creación de joyas. Barcelona: Promopress, 2018.

FILIPPELO, Roberto; PARKINS, Ilya. Fashion and Feeling. The Affective Politics of Dress. Springer, 2023.

FLUSSER, Vilém. Uma filosofia do design: A forma das coisas. Lisboa: Relógio d’Água Editores, 2010.

JOHNSON, Donald Clay. Dress Sense: Emotional and Sensory Experiences of the Body and Clothes. Oxford: Berg Publishers, 2007.

LIPOVETSKY, Gilles. A sociedade da sedução: democracia e narcisismo na hipermodernidade liberal. São Paulo: Editora Manole, 2020.

MERLO, Márcia. Memórias e Museus. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2015.

NORMAN, Donald A. Design emocional: por que adoramos (ou detestamos) os objetos do dia-a-dia. Rio de Janeiro: Rocco, 2008.

PEZZOLO, Dinah. Por Dentro da Moda. São Paulo: Editora Senac, 2019.

ROMÃOZINHO, Mónica. 2024. Assemblage+ Waste+ Memory = Jewel. In: CUNHA, J., BROEGA, A., CARVALHO, H., PROVIDÊNCIA, B. (eds). Advances in Fashion and Design Research II. 6th International Fashion and Design Congress, CIMODE 2023, 497-506. Cham: Springer Nature Switzerland AG.

SILVANO, Filomena. Antropologia da moda. Lisboa: Documenta, 2021.

STALLYBRASS, Peter. O Casaco de Marx: roupas, memórias, dor. – 4 ed. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012.

WALKER, Stuart. Design for resilience: Making the future we leave behind. Massachusetts: The MIT Press, 2023.

Número 43:

Moda e Figurino: transversalidades no processo e na pesquisa

Organizadoras:

Dra. Ana Cleia Christovam Hoffmann (Universidade Feevale)
Dra. Desirée Bastos de Almeida (UFRJ)
Dra. Rosane Muniz Rocha (Universidade FEBASP)

Prazo de envio dos artigos: 30 de julho de 2024
Previsão de publicação: abril/2025

Seja nas práticas discursivas cotidianas, seja nas artes das representações, a roupa se torna extensão do corpo. Como uma metamorfose, de formas e cores representativas de um corpo que está em movimento, se desloca em um espaço tridimensional e em um ritmo que, devidamente regulado, pode ter o rigor e a unidade de um movimento musical. Desta forma, o figurino deixa de ser um disfarce e torna-se elemento essencial do movimento dramático, atuando também como campo cenográfico.

Os de(signos) para esta área são muitos: “figurino”, “traje de cena”, “segunda pele do ator”, “design de aparência de atores”, “objeto sensível”, “vestíveis em fluxo”, entre tantos conceitos que são criados para designar o que se veste em cena e que “são elaborados de modo implicado ao corpo e ao movimento, produzindo imagens, corporalidades e aparências” (Diniz, 2012, p. 87).

O que cobre a pele do ator em cena, e que também pode ser nomeado de acordo com as funções que exercem a partir da concepção da encenação: figurino-máscara, figurino-invólucro, pele-figurino, figurino-espaço-corpo, figurino-prótese, figurino-penetrante… (Silva, 2005), grau zero do figurino (Hoffmann, 2021). O que também pode ser analisado não como “roupa”, mas como “modos do corpo” (Sousa, 2015) a partir do que o figurino constrói para a cena em seu campo expandido.

Ao compreender esta área como um campo empírico e de experimentação, portanto, criativo, nos interessa também abrir espaço para os processos de criação e metodologias que valorizam a criatividade, a inventividade e o trabalho artístico do figurinista/designer de moda e como este profissional transita nos setores da indústria criativa.

Este dossiê pretende reunir e propagar pesquisas que aproximam o campo da moda ao do figurino em diversos meios de manifestação artística, tais como teatro, dança, televisão, cinema, performance, intervenções artísticas etc., abrindo portas para teorias e reflexões sobre as vestes que compõem as práticas das poéticas espaciais, visuais e sonoras da cena. Deseja ainda aproximar pesquisador(a/e) que abordam as relações deste elemento artístico e cênico com suas sensorialidades, identidades, tecnologias, metodologias, entre outros entrelaçamentos e dar oportunidade a perspectivas que desafiem e quebrem paradigmas, aspectos historiográficos e elementos contemporâneos que interconectam a discussão.

O dossiê está aberto às pesquisas multidisciplinares e cartografias que dialoguem com outros campos do saber, incluindo a moda, as artes cênicas e visuais, e o pensamento transversal junto às ciências humanas em geral (filosofia, psicologia, sociologia, antropologia, semiótica…), se ampliando academicamente como um campo de cultura expandido e interdisciplinar.

Entende-se com isso, que as dimensões científicas, artísticas, tecnológicas e

econômicas serão contempladas ao buscar, nesta discussão que aproxima os campos da moda e do figurino, uma ampla possibilidade de atualização de novos conhecimentos e aprofundamentos, servindo de estímulo para construção de material teórico específico da área.

Portanto, interessa para este dossiê as seguintes abordagens de pesquisa:

  • Diálogo Moda e Figurino: sua relação e campos de atuação;
  • O figurino e o figurinista;
  • Processos criativos e metodologias de desenvolvimento;
  • Figurino, figurinista e o setor da indústria criativa;
  • Figurino, artes cênicas e visuais;
  • Poéticas espaciais, visuais e sonoras da cena e suas vestes;
  • Experimentações cênicas com trajes, para além de qualquer fronteira;
  • O figurino nas performances e instalações.

Bibliografia:

BARI, V.; VELOZ, P. Descubrir el vestuario: en las artes espetaculares. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Eudeba, 2021.

DINIZ, C. Vestíveis em fluxo: a relação implicada entre corpo, movimento e o que se veste na cena contemporânea. 2012. 105 f. Dissertação (Mestrado em Dança) - Escola de Dança, Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2012.

HOFFMANN, A. Fiapos, retalhos e (sobras) para possíveis entrelaçamentos entre figurino e moda na construção dos corpos performáticos contemporâneos. In: VIANA, F.; MUNIZ, R. (Org.). Diário de pesquisadores: traje de cena. São Paulo: Estação das Letras e Cores, 2012, p. 169-183.

HOFFMANN, A. O grau zero do figurino: aprender na d’obra. Tese (Doutorado em Educação). Universidade Federal do Rio Grande do Sul: Porto Alegre, 2021.

HOFFMANN, A. Performance Sulcos: corpo, traje de cena e criação. In: VIANA, F.; MOURA, C. (Org.). Dos bastidores eu vejo o mundo: cenografia, figurino, maquiagem e mais. São Paulo: ECA/USP, 2017, v. 2, p. 232-243.

MUNIZ, R. Vestindo os nus: o figurino em cena. Rio de Janeiro: Editora Senac Rio, 2004.

MUNIZ, R. Terminologias. In: ROCHA, R. M. Um panorama do traje teatral brasileiro na Quadrienal de Praga. Tese (Doutorado em Artes Cênicas). Escola de Comunicações e Artes, USP. São Paulo, 2016.

PANTOUVAKI, S.; MCNEIL, P. (org.). Performance costume: new perspectives and methods. 1. ed. Great Britain: Bloomsbury Visual Arts, 2021.

PIRES, B. O corpo como suporte da arte. São Paulo: Editora Senac, 2019.

RAMOS, A. O designer de aparência de atores e a comunicação em cena. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2013.

SILVA, A. J. Para acabar com o “costume”: figurino-dramaturgia. 2005. Dissertação (Mestrado em Teatro). Centro de Artes, Universidade Estadual de Santa Catarina. Florianópolis: 2005.

SILVA, A. J. Figurino-penetrante: um estudo sobre a desestabilização das hierarquias em cena. Tese (Doutorado em Artes Cênicas). Escola de Teatro, Escola de Dança, Universidade Federal da Bahia. Salvador: 2010.

SOUSA, H. H. P. Vestimentas em performance: composições em modos do corpo. Dissertação (Mestrado em Artes Cênicas). Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2015.

VIANA, F.; VELLOSO, I. Roland Barthes e o traje de cena. São Paulo: ECA/USP, 2018.